Igreja
O poema "Igreja", dedicado a Wellington Brandão, oferece uma reflexão sobre a construção física e simbólica de um espaço religioso, entrelaçando a materialidade do trabalho com a espiritualidade das práticas religiosas. Através de uma linguagem que enfatiza tanto o processo de construção quanto os aspectos litúrgicos e comunitários da igreja, o poema captura a dualidade entre o céu e a terra, o sagrado e o profano.
O início do poema, com a repetição de elementos de construção ("Tijolo areia andaime água tijolo"), evoca o esforço físico e a materialidade envolvidos na edificação da igreja, destacando o progresso em direção ao céu simbolizado pela construção da torre. Esta imagem sugere uma aspiração ao divino, ao sagrado, materializada através do trabalho humano.
A mudança para a descrição dos domingos introduz os aspectos litúrgicos e comunitários da igreja, com "a litania dos perdões" e "o murmúrio das invocações". A figura do padre, que "fala do inferno sem nunca ter ido lá", introduz um contraste entre a autoridade espiritual e a experiência vivencial, questionando a distância entre o conhecimento religioso e a realidade humana.
O poema também aborda a sensualidade e a humanidade dos fiéis, como visto em "Pernas de seda ajoelham mostrando geolhos", que contrasta a devoção religiosa com a beleza e a sensualidade terrenas. O sino, com seu "canto da saudade de qualquer coisa sabida e já esquecida", evoca uma nostalgia universal, talvez da conexão perdida com o divino ou com a própria essência humana.
A conclusão do poema, com a separação espacial entre o ateu no adro e Deus no alto, além da alegria expressa no "Bem bão! Bem bão!" e o canto dos serafins, ressalta a diversidade de experiências e percepções em relação ao sagrado. Essa diversidade reflete a complexidade das relações humanas com o divino, abrangendo dúvida, fé, alegria e a busca contínua por significado.
"Igreja" é, portanto, um poema que explora a interseção entre o físico e o espiritual, o trabalho humano e a aspiração ao sagrado, apresentando a igreja não apenas como uma estrutura física, mas como um espaço de múltiplas dimensões e significados, onde o divino e o humano se encontram e interagem.